CORDEL DO APRENDIZ
Teatro por Autor desconhecido em 19/03/2006
Cenário
Sala de uma casa típica de interior
Personagens
Maria
João
Maria Cremilda
Crianças (quantas ditar propícia)
Narrador canta em forma de cordel
Hoje venho pra contar a história do João que é bravo pra
dana e não aceita nada não. Sr. João é da fazenda e não tem estudo não, não
sabe lê nem escreve e não “conhece” religião.
No centro do palco se encontra João e Maria sentados em
cadeiras.
João: Meu nome Jão, essa é minha muié Maria, nóis tem duas
fiá (entram várias crianças) duas dúzia.
BLACKOUT
Entra Sr. João
João: Oh muié, ara... Que fome! Oh muié, meu bucho tá vazio,
daqui a pouco ele arria por baxo.
Entra Maria
Maria: Carma Jãozinho, aqui óia. Arroiz com cardo de arroiz.
Delícia... (lambendo os beiços)
Enquanto João come Maria rodeia a mesa inquieta.
João: Ara muié, q tá arrodiando a mesa ingual urubu? Se ocê
tá cum fome vai pega pru’cê.
Maria: Num é nada disso homi... É que... A Dona Cremilda
chamo eu pra i na ingreja hoje e ...
João: Já vem ocê cum essa história de novo... Já falei
pru’cê muié que num vai em lugá ninhum. Ocê tá me achando com cara de mula é?
Maria: Ara Jãozinho, que mula nada... Ocê é um toro, forte e
valente.
João: Nem vem adula muié, ocê que faze u que nessa tar di
ingreja hein? Já vi as muié ingual potranca dançando e cantando lá... Tu tá
querendo apronta né muié?
Maria: Ara Jãozinho, pára homi. Se sabe que num é assim...
João: Sei de nada não.
Maria: Mas é claro, num vai a ingreja...
João: Tenho mais o que faze muié...
Maria: Jãozinho... Eu levo as crianças... E ocê fica
descansando...
João: Já disse que não muié, ocê num vai ensina essas coisas
pras minha moça.Num quero vê minha muié e minhas moça na rua.
Maria: Mas Jãozinho eu num vô tá na rua... Vô tá na ingreja.
João: Pió ainda.
Maria: Óia aqui Sr. João, eu num sai da cidade pra...
João: Ara muié, óia como fala...
Maria abaixa a cabeça
João: Até perdi a fome.
Maria pega o prato e quando vai saindo vê sua filha
escondida
Maria: Escutando conversa outra vez né?
Maria Cremilda: O pai é muito chato...
Maria: Óia o respeito menina...
Maria Cremilda: Eu respeito mãe, mas...
Maria: Já tá tarde Maria Cremilda, vá drumi...
Quando a mãe vira as costas Maria Cremilda diz:
Hoje eu fui na igreja...
Maria: Ara menina... Desobedecendo seu pai?
Maria Cremilda: Eu tava indo estuda e ouvi eles cantarem e
dizerem bem alto: Deus é lindo... Quem é Deus mãe? Ele mora aqui perto?
Maria: Ele mora mais perto do que ocê imagina...
Maria Cremilda: E a senhora nunca me apresentou ele?
João entra aos gritos
João: Ara, Ara... O que ocês duas taum fazendu? Taum de
trelele á essa hora? Vaum pru quarto agora.
João puxa Maria Cremilda
João: To cansado de ensinar moça minha a ser prendada, moça
minha não fica pelos cantos carcarejando...
Maria Cremilda: O Sr. não quer aceitar a realidade pai...
João: Ara menina e oq ocê sabe de realidade? Ocê não entende
nada... Nem da sua própria vida.
Maria Cremilda: Eu entenderia muito mais se ocê me deixasse
í na ingreja pai.
João: Se ocê não pará de falação vô te cafofa menina... Sua
mãe já enchendo sua cabeça de caraminhola.
Maria Cremilda: Eu vejo a ingreja cheia de gente pulando,
dançando... Eles sim são felizes.
João: Eles são assanhados isso sim.
Maria Cremilda: Não são não pai.(começa a chorar)
João: Já disse pru ce não retruca menina... E pára de choro,
já é hora de moça minha tá na cama.
Saem cada um para um lado...
Luz baixa...
Luz alta...
Carcarejo de galo
Maria Cremilda: Vamos meninas, vamos atrasar.
João: Leva suas fia Maria.
João sai por um lado Maria e as crianças por outro.
Na estrada...
Maria Cremilda: Mãe, vamos passar pertinho da ingreja. Vamos
dar uma entradinha?
Maria: Não menina, seu pai num ia gosta...
Maria Cremilda: Mas ele num ia nem saber... Vamo mãe.
Maria Cremilda puxa a mãe pra dentro da igreja e as irmã
correm atrás
Uma das irmãs: Cadê o homi pelado que ocê viu?
Maria: Ara menina, óia o respeito dentro da ingreja.
Maria Cremilda: Num sei. Psiuuu!
Menos de um minuto depois Maria puxa as filhas
Maria: Vamu, já tá tarde.
Maria Cremilda: Mas mãe nem terminei.
Maria sae puxando as filhas
Maria em casa varrendo e escutando música sertaneja num
radinho á pilha. Olha para os dois lados e muda a rádio sintonizada. Ao ouvir
uma música agitada de igreja começa a dançar. No auge de sua empolgação João
entra furioso e desliga o som.
João: Ocê tá ficando atrevida igual muié de ingreja.
Maria: Eu só tava...
João: Dançando... Eu ví.
Maria: Mas era pra Deus...
João: Ocê lá conhece Deus... Cê nem sabe se ele é bão ou
não...
Maria: Sei sim Jão, e ocê também sabe...Sabe que ele morreu
na cruz por nós.
João: Por acaso ele ia ser mula de morrer por nós? Isso é
tudo mentira.
Maria: Pára Jão, você sabe que num é assim. Ocê sabe tudinho
da vida dele.
João: Sei mas não queria nem saber. E ocê num vai ficá
ensinando essas coisas pra minhas moça.
Maria: E por quÊ não JoÃo?
João: Ara muié, não quero que elas sofram...
Maria: Pára de bobeira homi... Deus não faz ninguém sofrer,
muito pelo contrário.
João: E por que ele me fez entaum? Levo meus pais e me deixo
na miséria...
Maria: Ocê só não sabe a resposta por que nunca perguntou
pra ele.
João: Não quero mais papo com esse tar de Deus.
Maria: Não adianta cê fugi Jão, se ocê não encontra cum ele
aki ocê vai encontra lá no cer.
João abaixa a cabeça
Maria: Ocê é um homi bão de coração. Por isso nunca desisti
de ocê. E esse tar de Deus que ocê diz é que num deixó eu te largá. Se ocê dê
uma chance pra Deus faço uma canjiquinha pru`cÊ. Que tar?
João: Ara muié...(bravo)
Maria: Ara Jãozinho.(carinhosa e o acariciando)
João anda para um lado e para o outro enquanto Maria o olha
com carinho. João pára no centro do palco.
João: Tá bom muié, mas ocÊ que num faiz minha canjica pra
vÊ...
Maria: Craro que faço Jão.
Narrador (canto em forma de cordel):Sr Jõao foi vencido pela
oração de Maria, seu coração amolecido e sua fé fortalecida.
Maria (canto cordel): A paciência é o Dom divino que Jesus
me cedeu e hoje tenho o marido que a mim prometeu.
Crianças (canto cordel): O coração do meu papai Jesus
converteu e o que era impossível hoje mesmo aconteceu.
Silêncio, todos olham para João.
João: Ara, ocês já querem demais.
FIM
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